Nativa do Brasil e ingrediente básico da culinária indígena, a mandioca foi descrita pelos cronistas portugueses já nos primeiros registros sobre a flora brasileira. Muito consumida em todas as partes do país até os dias de hoje, é um dos produtos-chave para entender nossa alimentação. Não à toa, recebeu de Câmara Cascudo o título de realeza. O primeiro episódio de História da Alimentação no Brasil nos leva até o Pará para acompanhar a fabricação artesanal da farinha de mandioca, mostra-nos a riqueza de adaptações e derivações proporcionadas pela planta e revela o resgate da tradição que cozinheiros brasileiros têm feito ao oferecer pratos com mandioca em seus restaurantes.
Cultuado pelas antigas civilizações da América, o milho já era ingrediente incontestável na dieta alimentar indígena quando o português desembarcou no Brasil. Alimento versátil, perene e por isso essencial nas longas viagens pelo interior do país, onde até hoje está associado à fartura e à comida de sustância, dando força, vigor e robustez ao sertanejo. O segundo episódio de História da Alimentação no Brasil apresenta o tradicional beiju de milho, feito pelas mãos de uma cozinheira Guarani, que nos mostra a importância histórica do milho na cultura brasileira, em especial nos festejos de São João, e o debate sobre as sementes transgênicas na produção do grão, além do preparo de um prato “mata-fome” acreano à base de cuscuz de milho.
Os índios brasileiros não conheciam grande parte das espécies de banana que comemos atualmente. Essas foram trazidas pelos colonizadores portugueses. Ao longo dos séculos, a fruta ganhou importância no cardápio do brasileiro e adquiriu uma série de significados simbólicos em nosso folclore, na arte e na cultura de massa, criando uma associação entre a banana e a ideia de latino-americanidade. O terceiro episódio de História da Alimentação no Brasil traz um prato feito com uma parte geralmente pouco utilizada da bananeira, o “umbigo” ou “coração”, além da preparação de um purê de banana servido em um dos mais tradicionais restaurantes de Belo Horizonte. O episódio também nos conta como Carmen Miranda criou sua personagem e se apropriou da função simbólica da banana ao longo de sua trajetória artística.
A enorme tradição culinária indígena encontra sua expressão na figura da cunhã, a primeira cozinheira, dona dos saberes e mãe dos primeiros pratos. O uso das pimentas, das ervas, a caça e o moquém, precursor do característico churrasco brasileiro, estão entre os traços distintivos dessa cozinha, ligados ao ritual do preparo e do consumo. No quarto episódio de História da Alimentação no Brasil, viajamos até o mercado Ver-o-Peso, no Pará, onde conhecemos os comerciantes locais, especialistas nas receitas amazônicas, como a maniçoba e o tucupi, e entendemos os mitos indígenas ligados à alimentação. Além disso, acompanhamos a busca por um alimento surpreendente em meio aos juçarais do Maranhão e o preparo de uma paca por uma renomada chef brasileira.
As papas, mingaus, pirões e refrescos sempre tiveram papel importante entre as comidas consumidas pelos indígenas – fornecem energia ao passo que refrescam o corpo nos climas quentes. Já em dias de celebração, há o costume de preparar bebidas alcoólicas fermentadas, ingeridas durante rituais. Neste quinto episódio de História da Alimentação no Brasil visitamos um parque no Maranhão, onde se encontra a juçara, planta ameaçada de extinção que dá frutos muito similares ao açaí. Conhecemos também a tiquira, bebida destilada feita de mandioca, exemplificando a miscigenação entre a técnica trazida pelo colonizador e o ingrediente já conhecido pelo colonizado.
Presente em todo o litoral brasileiro e símbolo da tropicalidade, o coco é uma fruta abrasileirada, mas remonta sua origem em terras asiáticas e foi introduzido no Brasil por mãos portuguesas. Extremamente versátil na culinária, o leite de coco foi incorporado nos pratos de origem africana, equilibrando os sabores da moqueca e adoçando o cuscuz. O sexto episódio de História da Alimentação no Brasil nos leva até Salvador para acompanhar o preparo de um bobó de camarão e da tradicional moqueca baiana, mostra-nos a fartura de pratos e receitas, doces e salgadas, protagonizadas pelo coco e seus derivados, além de mergulhar na pioneira viagem de Câmara Cascudo à África, em 1963.
O legado africano na culinária brasileira não se deu apenas através dos países da África subsaariana. O cuscuz, prato típico do norte da África, teve sua introdução no cardápio brasileiro através dos colonizadores portugueses, e até hoje constitui um alimento básico, principalmente no Nordeste do Brasil. No sétimo episódio de História da Alimentação no Brasil, acompanhamos a fabricação artesanal do cuscuz de farinha de milho com moinho manual e conhecemos a grande variedade de cuscuz presentes no Brasil e na África, além da preparação do tradicional “cuscos” trasmontano, prato português em desaparecimento.
Jamais saberemos o número exato de africanos escravizados que desembarcaram no Brasil. Em terras brasileiras, houve o encontro de muitas nações e culturas, de povos que, na África, são tão dessemelhantes quanto um russo de um inglês. Aqui trocaram experiências e costumes, sob as mais adversas condições. Criaram, reinventaram e preservaram sua gastronomia, seja nos gestos, nos ingredientes ou nos modos de preparo, alinhando comida e religião. Neste oitavo episódio de História da Alimentação no Brasil testemunhamos a produção caseira do azeite de dendê, diretamente do Recôncavo baiano e adentramos o mundo das comidas de terreiro, marca do sincretismo religioso afro-brasileiro que ganhou as ruas pelas mãos e tabuleiros das quitandeiras. O episódio nos mostra também o preparo do arroz hauçá, prato oferenda para o Orixá Omulu e do frango com ginguba, típico das cozinhas angolanas.
A relação entre as culinárias brasileira e portuguesa é uma história de trocas e adaptações. Os primeiros colonizadores europeus trouxeram mantimentos de sua terra natal, mas também se depararam com a necessidade de adequar seus hábitos à oferta local de alimento. Ao longo do tempo, criou-se uma “cultura transatlântica” da comida, na qual os dois lados promoviam o intercâmbio de costumes alimentares. O nono episódio de História da Alimentação no Brasil apresenta os pilares dessa rica culinária – a carne de porco, os frutos do mar, o pão, as hortaliças –, mostra a preparação de um prato clássico, as tripas à moda do Porto, e uma releitura do cozido à portuguesa nas mãos de um chef-estrela de Lisboa.
Na opulência dos palácios, as cozinhas reais serviam banquetes festeiros e requintados, tão fartos e luxuosos quanto permitiam as condições econômicas de Portugal. A alimentação privada da família real, no entanto, era discreta e de poucos gastos. A chegada da corte portuguesa ao Brasil, trouxe novos ingredientes e novos costumes à mesa, ao mesmo tempo que, aqui, tiveram que se habituar aos ingredientes nativos, inevitavelmente incorporados à dieta alimentar de Portugal. No décimo episódio de História da Alimentação no Brasil conhecemos a sala de jantar do Palácio Nacional da Ajuda, em Lisboa, deciframos as preferências alimentares da corte através dos registros históricos do cozinheiro Domingos Rodrigues, visitamos olivais centenários na região de Trás-os-Montes e a Festa do Divino Espírito Santo no Maranhão, onde a tradição de alimentar os festeiros transformados em reis e rainhas perdura até os dias de hoje
A trajetória da doçaria de Portugal é extensa e complexa. Muito antes da popularização do açúcar e da construção de engenhos no Brasil, já se fazia doces com mel de abelhas, influência dos mouros que ocuparam a península ibérica. Mais tarde, ela diversificou graças à atividade dos conventos, que produziam doces agregando a utilização de ovos e especiarias, constituindo uma espécie de “laboratório” do açúcar. Neste décimo-primeiro episódio de História da Alimentação no Brasil, temos acesso à fábrica que produz os pasteis de Tentúgal, doce cuja massa é esticada no chão de uma sala e requer um conhecimento muito específico, adquirido ao longo de anos. O episódio também nos mostra a diferença entre o manjar brasileiro e um tipo de manjar português, feito com peito de galinha desfiado, e revela o processo de fabrico dos Pasteis de Belém, doce similar ao pastel de nata e muito popular entre os turistas.
A doçaria brasileira é fortemente marcada pela influência portuguesa, mas se caracteriza pelas adaptações da tradicional doçaria conventual aos ingredientes nativos e modos de preparo possíveis em terras brasileiras. Aqui, a abundancia de espécies frutíferas aliada à onipresença da produção açucareira fez nascer um sem-número de doces de frutas e compotas de todos os tipos. O décimo-segundo episódio de História da Alimentação no Brasil vai até o Pará, acompanhar o processo de produção do chocolate artesanal feito com cacau nativo da Amazônia. Em Goiás, encontramos o universo da doçaria familiar e sua relação com a literatura na cidade natal da poetisa Cora Coralina. No Rio Grande do Norte, vemos a feitura do alfenim, doce que alia o açúcar, produto base da colonização brasileira, com a técnica da tradição doceira portuguesa.
No episódio final de História da Alimentação no Brasil, adentramos o universo de Luís da Câmara Cascudo, etnógrafo, folclorista, historiador e autor do livro no qual a série se baseia. Através de uma riqueza de materiais de arquivo e entrevistas com especialistas e membros da família do escritor, acompanhamos o processo de pesquisa de Cascudo, suas viagens pelo Brasil e fora dele e conhecemos as principais ideias deste livro que é um grande marco nos estudos sociológicos sobre a alimentação brasileira.