Fazia tempo que eu não acordava e ficava olhando o teto até ele ficar cada vez mais branco. Fazia tempo que eu não deixava o meu corpo acordar sozinho, assim devagar, no meu dia de folga. Fazia tempo que eu não sentava na cadeira da cozinha com uma xícara de chá e com o olho pousado sem pressa no prédio da frente ia vendo as janelas mudarem de cor. Apagada, apagada, acendeu, acendeu, apagou, ligaram a teve, alguém apareceu na varanda. Fazia tempo que eu não esperava na fila do supermercado sem tentar distrair o meu tédio. Sustentando meu tédio. Fazia tempo que eu não lembrava que tá no silêncio que a gente não faz a maior parte das respostas que a gente procura. Fazia tempo que eu não dizia para minha angústia: essa pressa que você quer nas coisas não existe nas coisas da vida real. A vida real tem o próprio tempo e sendo você o tempo, você também.